Cuidado com o uso indiscriminado de anticoncepcionais

Para reduzir os riscos à saúde, mulheres devem buscar orientação médica antes de iniciar o tratamento.

Para tratar um mioma em estágio avançado, sem que para isso fosse preciso uma intervenção cirúrgica imediata, a manauara Angélica Ribeiro da Costa, 33 anos, fez uso da pílula anticoncepcional por três anos. A medicação foi suspensa após o diagnóstico de embolia pulmonar.

“É algo que até hoje não sei como explicar. Quando o médico comunicou-me sobre a embolia, eu sequer sabia o que era. Comecei a pesquisar e encontrei milhares de informações que até então, desconhecia. Passada esta etapa, soube da gravidade do problema”, conta a gerente de condomínio, que não integra o chamado “grupo de risco” – mulheres com mais de 35 anos, obesas, fumantes, sedentárias ou com histórico familiar da doença.

Depois de um longo tratamento, a jovem recebeu alta no início do mês de julho. “Meu médico disse para eu ter uma vida normal, mas com cautela, como por exemplo, usar meias de compressão ao viajar. Nunca mais poderei tomar anticoncepcional ou qualquer outro tipo de hormônio, além de ficar atenta aos possíveis sintomas, pois há o risco de a embolia voltar”, relata.

Mesmo com o fim das constantes visitas ao consultório médico, Angélica e outras mulheres convivem com o temor diário. “O medo existe em momentos, como viajar para lugares mais distantes e por não saber identificar novamente os sintomas do problema. Como muitos dizem, ‘vivo com a sorte’”, conta.

Para evitar que mais pessoas passem por algo semelhante ao que viveu, a jovem faz um apelo: “procurem informar-se sobre o assunto, pois, carregamos uma ‘bomba atômica’ que pode explodir a qualquer momento, e que devido à falta de informação, muitas fazem uso (do anticoncepcional) sem ao menos saber o que pode lhes esperar. Sou a favor de mais informação, mais divulgação do assunto, que tem feito mulheres e famílias infelizes”, alerta.

O caso de Angélica está entre os vários diagnosticados no mundo, nos últimos meses. Tido como o método contraceptivo mais usado pelas mulheres, a pílula anticoncepcional tem eficácia de, em média, 99%. Conhecido por impedir a gravidez, o medicamento ameniza a cólica menstrual, o excesso de menstruação, a TPM (tensão pré-menstrual), cistos no ovário, entre outros sintomas.

Mas, quais os motivos que têm feito dela uma vilã nos últimos tempos? Os médicos Alessandra Bedin Rubino, José Bento e Mariana Bignardi Halla esclarecem dúvidas sobre os grupos mais propensos a terem problemas relacionados aos contraceptivos e os cuidados a serem adotados para reduzir os possíveis riscos.

José Bento, ginecologistaconsultor do programa “Bem Estar” da Rede Globo e autor do livro “A Saúde da Mulher”, da editora Alaúde

Nos últimos meses, notícias divulgaram as patologias provocadas pelo uso do anticoncepcional. Em suma, quais riscos correm as pacientes que usam o remédio?

O que mais apavora as mulheres quando se usa a pílula é o risco de trombose, uma embolia, que pode ir para o pulmão, entre outros. É lógico que existem alguns fatores de risco, mas quem avalia os eventuais problemas é o médico durante a consulta, na avaliação dos exames e na prescrição. Quando o profissional verifica se há precedentes de tromboembolismo, se a paciente é obesa, sedentária, fumante e tem mais de 35 anos de idade, além de outros fatores que podem aumentar as chances de possíveis problemas causados pelo uso do contraceptivo.

Faço questão de ressaltar, que os benefícios do uso da pílula são muito maiores quando comparados aos problemas, uma vez que a mulher tem menos chances de endometriose, miomas, câncer do endométrio e dos ovários. Em todo o mundo é grande o número de pessoas que deixaram de morrer de câncer de ovário devido ao uso da pílula.

Quem utiliza pílulas por anos pode ter a saúde prejudicada?

O fato de ela tomar a pílula com orientação e de maneira correta, reduz os riscos de levá-la a problemas. Mas, em alguns casos, o medicamento pode trazer efeitos colaterais, como aumento de varizes, dor nas mamas, entre outros. No entanto, é uma faixa pequena de pessoas que sente tais sintomas.

Mariana Bignardi Halla, ginecologista endócrina

Artigos médicos apontam que um dos problemas causados pelo consumo prolongado do anticoncepcional, é a trombose. Tal risco existe?

A pílula pode aumentar de quatro a seis vezes o risco de uma mulher apresentar este evento, e cuidado maior deve ser dado às sedentárias, com sobrepeso ou obesas e, principalmente, nas tabagistas. Por essa razão, ficam proibidas de tomar anticoncepcionais se maiores de 35 anos e fumantes. Aquelas com enxaqueca crônica devem ser advertidas ao uso após esta idade, pelo maior risco da enfermidade citada. Em pacientes com história pessoal de trombose, ou na família, uma pesquisa de mutações genéticas para trombofilias pode ser feita, e caso estejam presentes, outros métodos de anticoncepção devem ser adotados, como o DIU de Cobre ou o medicado com Levonorgestrel, que, embora seja um hormônio, não aumenta o risco de trombose.

Há evidências de que o uso contínuo da pílula pode causar câncer ou infertilidade?

Não. Embora alguns estudos apontem um aumento do crescimento de tumores preexistentes, como o de mama com o uso do hormônio, razão pela qual não devemos empregá-los na vigência ou antecedência dessa doença. O câncer do colo uterino ainda tem como principal causador o HPV, assim, estudos foram contraditórios em dizer que a pílula poderia aumentar esse tipo de câncer. O retorno à fertilidade após uso da pílula deve-se fazer em até seis meses.

Alessandra Bedin Rubino, ginecologista e obstetra do Hospital Israelita Albert Einstein

Como é possível identificar uma paciente que pode desenvolver doenças devido ao uso do contraceptivo?

Avaliar o fator de risco, por meio de uma boa conversa, é fundamental. Por isso, a máxima “o anticoncepcional da minha amiga serviu, vou usar” é perigosa e não pode ser aplicada. Verificar o histórico da paciente e analisar pontos, como triglicérides, que podem piorar com o uso do anticoncepcional via oral, é essencial. Em suma, a questão não é somente orientar apenas o início do uso do anticoncepcional, mas observar como a mulher se mantem ao longo do uso. Assim, a conversa inicial é importante, mas o acompanhamento da paciente é necessário.

Quais são os principais sintomas verificados no início de uma trombose ou embolia pulmonar, por exemplo?

Os primeiros sintomas da trombose clássica aparecem nas panturrilhas provocando dores, inchaço, aumento da temperatura das pernas e vermelhidão. Já no caso da embolia, o principal sinal é a falta de ar, caso a pessoa não possua histórico de outras doenças respiratórias, além de tosse seca.

É importante destacar, que não falamos apenas da contracepção oral, mas sim, a ingestão de contraceptivo hormonal pode aumentar o risco de tromboses.

Os profissionais recomendam às mulheres que possuem histórico prévio de câncer de mama, trombose venosa profunda, hipertensão arterial não controlada ou doença vascular, doença cardíaca isquêmica, acidente vascular cerebral (derrame), diabetes sem controle ou que sejam tabagistas com mais de 40 anos, a buscar orientação profissional antes de optar pelo método contraceptivo.

Disponível no Site do Instituto Assaly