É verdade que a reposição dos hormônios femininos tem prazo pré-determinado? E o que acontece quando é preciso interrompê-la? Especialistas respondem aqui
Para lidar com sintomas da menopausa como ondas de calor, insônia, ressecamento da vagina, falta de libido e irritabilidade, muitas mulheres recorrem à terapia de reposição hormonal (TRH), à base dos hormônios femininos, estrogênio e progesterona. E, em boa parte dos casos, o tratamento é bem-sucedido, o que gera dúvidas sobre a hora de parar. Ao contrário do que muita gente pensa, não existe mais um prazo pré-determinado. “Quando corretamente indicada, a terapia pode ser mantida enquanto os benefícios persistirem”, esclarece César Eduardo Fernandes, médico ginecologista e presidente da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia, Febrasgo. Segundo ele, há pacientes que precisam dela por um curto período – de um a dois anos –, outras, por cinco anos, e, uma minoria, por dez anos ou mais.
“O entendimento de que a terapia tem um prazo pré-determinado parte de equívocos da literatura médica e dos profissionais propriamente ditos”, fala o presidente da Fegrasgo. O maior receio de quem faz a TRH diz respeito ao câncer de mama, já que estrogênio está relacionado ao desenvolvimento da doença. O estudo que relacionou os dois fatores – TRH e câncer com mais contundência e estipulou o limite de segurança em cinco anos –, foi feito em 2002 nos Estados Unidos, em condições que já não prevalecem hoje em dia. “Foram usados hormônios derivados de urina de éguas prenhas e progestágenos sintéticos. Além disso, metade das mulheres tinha sobrepeso ou eram obesas, condições que favorecem doenças como o câncer”, relata Mariana Halla, médica especialista em ginecologia endócrina, de São Paulo. Nesse perfil, com cinco anos de uso, houve um aumento de 24% na incidência de câncer de mama, o que fez com que as prescrições sofressem uma grande queda no mundo todo, em torno de 75%.
A terapia, porém, evoluiu desde então. “Atualmente, os riscos da reposição hormonal são muito menores do há duas décadas”, reforça César Eduardo Fernandes. Contribuíram para o aumento da segurança os novos hormônios – o estrogênio de mesma estrutura molecular e progesterona natural – as dosagens menores e também a via em que eles são administrados: transdérmica, na forma de gel e adesivos, e não oral, que aumenta o perigo de trombose. Mas ainda que menores, os riscos devem ser individualizados. “Eles podem ser insignificantes perante a intensidade de sintomas de algumas mulheres e completamente proibido para outras que já trazem riscos por outras causas — como obesidade e antecedente de câncer de mama”, afirma Aricia Helena Giribela, ginecologista e mastologista com doutorado pela USP, de São Paulo. Portanto, deve-se sempre levar em consideração a equação custo-benefício.
Na maioria dos casos, a TRH dura de dois a três anos após a menopausa, período que tende a ser mais crítico. Os sintomas são individuais em intensidade e duração — ou seja, a sua menopausa não vai ser igual a da sua mãe ou irmã. Além disso, fatores externos também podem influenciar: no verão, os fogachos pioram, assim como em situações de stress. Quando o tratamento é interrompido, os sintomas podem voltar. No início, os mais comuns são os fogachos; alguns anos depois, a secura vaginal é o pior incômodo; e o problema mais tardio é a osteoporose. Se eles forem fugazes, é melhor aguardar um período para perceber se há acomodação nessa nova etapa. No entanto, se forem fortes o suficiente para afetarem a qualidade de vida, o tratamento pode ser retomado. Quanto mais longo ele for, maior a necessidade de acompanhamento médico constante. A partir dos cinco anos, além dos exames de rotina, como a mamografia e o ultrassom de mamas, podem ser indicados exames de maior complexidade, como a ressonância magnética das mamas, para o rastreamento de tumores, já que há, segundo os especialistas ouvidos aqui, em pequeno aumento do risco de câncer de mama.
Além de melhorar os sintomas que acometem cerca de 70 a 80% das mulheres na menopausa, a TRH apresenta benefícios como proteção contra a osteoporose (é a principal terapia para tratar essa doença) e menor proporção de problemas vaginais e urinários. “Mas ainda faltam dados sobre os efeitos na demência”, informa Aricia Helena Giribela. Está sendo estudada também a ação da TRH na redução de problemas cardiovasculares e outros tipos de câncer, como o de intestino. “Quando o tratamento é bem indicado e acompanhado, os riscos são minimizados quando comparados aos benefícios”, fala Mariana Halla.
Seja com mais – ou menos – ocorrências, a menopausa é um período de transição tanto hormonal como de maturidade na vida da mulher e traz transformações que se perpetuam pelo resto da vida. Independente dos tratamentos, as mudanças de comportamento em prol da qualidade de vida são fundamentais, o que inclui alimentação equilibrada, atividades físicas e de lazer, qualidade de relacionamentos. “Costumo dizer hoje, aos 46 anos, que tudo que faço é pensando em quem quero ser aos 80”, resume Aricia Helena Giribela.
Disponível no Site Vogue Brasil, 29/11/2019, por Olga Penteado